A Guilda dos Melancólicos

Blog eclético, hermético e patético

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Crónicas do Chef

A Vera tem razão. Se nos portarmos com mais glamour a nossa vida será mais glamourosa. Ou pelo menos disso viveremos a ilusão, o que vai dar no mesmo. Por isso em vez de chegar a casa e aninhar em frente à televisão a ver a novela e a comer directamente da lata de atum, há que assumir a pretensão de que temos estilo. A Vera bebe martinis solitários. Doseia mal a bebida e acorda no dia seguinte com a ressaca de uma grande estala. Mas isso não interessa nada. Até que o "Martini Shaken, not stirred" a leve ao tapete, eternize-se o momento elegante de uma gaja solteira a viver na Almirante Reis. Do outro lado do rio, o Rui prepara-se para atacar a cozinha. Coloca o avental. Está com uma velha sweat-shirt e não virá mal ao mundo se a sujar. Mas o avental faz parte do ritual estilizado, sobretudo se se é um gajo solteiro. Por isso, repetimos, coloca o avental. Hoje decidiu que vai cozinhar algo vegetariano. Perceba-se os porquês. Antes de mais o Rui nunca cozinhou nada de vegetariano, nem percebe sequer dos rudimentos dessa arte. Aliás, na cozinha o Rui é um caso perdido de preguiça de as mais das vezes olhar para a receita. Mas como Deus é justo, compensou-o com um certo talento natural de vislumbrar misturas que resultem. Por isso o Rui vai na realidade inventar algo que ele julga que não ande muito longe do conceito de comida vegetariana. Porquê vegetariano? O Rui tem várias razões. Vegetariano é vagamente mais light. Vegetariano é sobejamente mais fashion. E vegetariano ajudará a debelar o stock de vegetais que certamente apodrecem mais depressa do que as conservas da dispensa ou os bifes do frigorífico. Seja pois vegetariano!
Passo um, abrir o frigorífico. O prato incluirá tudo o que lhe pareça compatível e que tenha que ser brevemente gasto. Tira 3 tomates pequenos, 4 cenouras e os cogumelos frescos que ainda tem. O pepino e a alface não lhe parece que liguem a um prato quente e ficam a envelhecer mais um dia. Sobre a pedra um pano e sobre o pano uma tábua de madeira. Faca. Para cima do fogão uma frigideira grande e um tacho do seu fantástico conjunto da Filipa Vá Com Deus, de asas douradas e fundo de braquelite. Tudo foi lavado da loiça suja, para não aumentar a factura do que depois terá que lavar. Finalmente, aos 30 anos, o Rui começa a ser metódico na cozinha. Bravo, rapaz!
Corta-se cebola em rodelas. Duas pequenas. Os tomates também em rodelas. Alho esmagado. Pitada de sal E tudo para a frigideira com um fio de azeite a cozinhar em lume brando. Entretanto corremos ao escritório a colocar Black eyed Peas suficientemente alto para que se sinta a vibe no fogão. Podemos ir tranquilos de que o Hamlet e a Marta não atacarão o cozinhado. Uma outra vantagem antes não elencada do vegetariano é que nos tranquiliza do corso dos gatos que não são de todo vegetarianos.
Coloca-se em água para ferver a cenoura em rodelas e os cogumelos. Um pouco de sal. Quase nada. E não Joana, cogumelos de lata não vai dar ao mesmo. Entretanto a cebola começa a aloirar e a fazer um creme. Ora bombe-se castanha congelada previamente picada. Por cima acrescente-se manjericão e aquela especiaria vermelhinha que tenho cá num frasquinho mas não vos sei dizer como se chama (LOL). Toca a misturar de colher de pau, que está proibida na UE mas não na casa do Rui.
Entretanto a água levanta fervura. Tempo de retirar os cogumelos da cozedura e misturar à frigideira. E para o lugar destes entra massa Fusilli. Aqui há um detalhe importante. Não vamos colocar muita massa. Se aquilo no fim parecer uma massa de qualquer coisa, pronto, perdeu-se o charme. Vai parecer uma pratada de massa feita por um solteiro ranhoso. Rancho, diria o Ricardo. Nada disso! Vamos colocar alguma massa que não saia protagonista na mistela. Recomendo os fusili coloridos porque vão ficar lindamente com os tons da castanha, tomate e cenoura, quando no fim misturarmos tudo.
Entretanto coloque-se a tampa sobre a frigideira para que o vapor ajude ao processo. Retirámos a castanha directamente do congelador para o fogo, porque nos esquecemos de o fazer com aviso prévio e portanto queremos muito calor naquela firigideira para no fim não mordermos gelo.
Entretanto lava-se prato, copo e talheres. Estamos de facto a ficar metódicos.
Passam cerca de 8 minutos e o nosso cronómetro em forma de galinha apita a hora da mistura final. Fusilli e cenoura para a frigideira, um pouco de noz moscada, renovado fio de azeite. Colher de pau a baralhar a coisa. Está pronto!
Recomendamos que se sirva com um bom tinto à temperatura ambiente e à media luz.
Para ter bons tintos a preço acessível recomendamos dar uma vez por mês jantares em casa e incentivar os amigos a trazerem vinho... ... chagar-lhes antecipadamente o juízo com piadas sobre o seu fraco gosto vinícola poderá melhorar o resultado pretendido.
E pronto. Deliciámo-nos e no entusiasmo decidimos escrever esta crónica.
A cabeça queda-se de uma anestesia doce dos dois copos que bebemos e na casa paira um cheiro agradável a boa cozinha.
A cunhada deslumbrante do vizinho de baixo certamente não me resistiria se passasse à minha porta.
E por fim resta-nos rezar para que Zé não seja leitor deste blog, eheheh
Bom apetite!

terça-feira, fevereiro 27, 2007

Hi5

O meu hi5 estava cheio de gente duvidosa na minha network, muita mama, muita pila, enfim, uma viagem de carrocel ao dark side da rede. E porquê? Desconfio que fui arrastado para os meandros por uma manhosa que me adicionou como amiguinho.
Pensando no assunto, primeiro fiquei preocupado que a mesma gaja que adiciona fotos de pilas me adicione também a mim. Temo que o meu perfil não esteja a passar a mensagem certa.
Seja lá como for aproveitei para fazer faxina. Os poucos "amigos virtuais da tanga" que por lá tinha foram vassourados. Pronto, ok, deixei ficar a morena gira que me adicionou há dia. Mas já trocámos uma mensagem. Isso faz de nós amiguinhos, certo? :o)

Talento

Não tenho nada contra projectos comerciais e artisticamente descomplexados.

Mas se deram tudo aos Dzrt e aos 4Taste (a dos putos pseudo punks la, la , la, é assim que se se chama, não é): uma campanha esmagadora de publicidade, a visibilidade da novela, e suponho eu que meios técnicos muito à frente... ... porque raio é que eles não me trazem nada que eu consiga sequer cantarolar?

Voltem, Excesso, estão perdoados!

Ideia idiota do momento

Metade drop, metade pastilha.

Cheira-me portanto que vai ser um sucesso...

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Os ses e a roleta da vida

Hoje está um dia cinzento, não gosto de dias cinzentos. Lembram-me sempre que a vida tem todas as cores, até as mais deprimentes.

É nestes dias que não consigo parar de pensar na vida, o cinzento remete-me a um retiro pessoal, rabugento e intolerante. Fico agreste, fico triste, chora-me a alma.
Fecho-me em mim e medito, nos dias, nas horas, nos minutos, no bater do meu coração.

Medito nas coisas parvas, como o se. Os ses são coisas parvas. Os ses deixa-me desconfortável, principalmente se pronunciados de forma a darem ideia de uma acção que nos remete ao passado.
Se eu tivesse dito isto, se eu tivesse feito aquilo, se eu tivesse mostrado isto, dado aquilo…enfim uma infinidade de ses.
Na vida profissional corto logo com os ses… Se o Diogo tivesse feito…, É que nem deixo acabar a frase porque intervenho logo: Epá se o gajo não morresse, estava vivo! E acaba-se logo ali com o se.
Na vida pessoal tem os seus dias, os ses são lixados, começam assim: se eu, se ela, se ele e acabam sempre com uma hipótese ainda mais frustrante.
Os ses minam a nossa vida, transformam-na num jogo de roleta. Se eu quisesse, o Luis teria ficado comigo, mas não quis, e agora ele anda com a Maria. Mas a verdade é que, se o João não tivesse deixado a Maria, ela não o teria largado por livre vontade e se não fosse assim ela hoje não estaria com o Luis. Pois a Sofia andava a rondar e a Maria não é tonta, porque se fecha os olhos, a Sofia tal qual uma felina, teria deferido golpes certeiros nesse futuro relacionamento.
E podemos continuar a desfiar o novelo de ses…
Se ele me amasse, se ela me convida-se para entrar, se ele dissesse uma palavra apenas, e se depois de entrar, ela tirasse o vestido, se ele me desse um beijo, se ela depois de tirar o vestido despia-me também, se ele me desse um abraço, e se ela depois fizesse sexo louco e selvagem, mas e se ele não é o tal.

Os ses comandam a vida ou melhor uma parte da nossa vida, os nossos sonhos que dependem dos ses da vida. Se eu tivesse pedido perdão, se eu tivesse ajudado, se eu ganhasse o euro milhões … é pá da quase vontade de gritar se estar morto é estar morto então, o contrario disso é estar vivo.
Há dias assistia a um programa de dança na televisão e numa das situações o professor de dança profere esta frase” Roxo, não meu, roxo não, roxo da azar” Dá-me vontade de dizer o mesmo cada vez que eu oiço um se “ Se não meu, se não, se pesa depois na consciência, deixa-te disso”

Ergo a mão e apetece-me dar um murro na mesa e gritar. Que se f* os ses e já agora os dias cinzentos quando calham em segundas-feiras e que ainda por cima são passados a trabalhar.

É curioso pensar na diversidade de caminhos que podemos seguir. Há cerca de dois anos um grupo de 12/13 pessoas celebrava o fim da licenciatura num restaurante em Almada. Passado este tempo, que afinal nem foi assim tão longo, a forma mais prática de comunicação que encontrámos foi a troca de e-mails, como já vai sendo habitual em núcleos de amigos. Mas o que é verdadeiramente extraordinário é pensar que para visitar um amigo se tenha provavelmente que comprar uma passagem de avião, olhar para a data de validade do passaporte e cambiar alguns Euros. É que à data de hoje, as mensagens chegam-me desde Lisboa, Madrid, Paris, Londres, Boston, Shaoxing...

domingo, fevereiro 18, 2007

Fim de semana

O fim de semana foi enfadonho. Esperava outra coisa. Diversão e um pouco de estudo no Domingo.
A sexta foi boa demais... ....só o final da noite foi marcado por uma forte chuvada, causadora da gripe que agora tenho em cima... ...
Na sexta decidi ir ver um filme, o tal programa soft que sabe tão bem, ... ....e eu apaixonada que sou por cinema ainda me sabe melhor.
O filme foi pequenino. Olho para o relógio e penso... ....que tal uma ida a um barzito na Costa da Caparica? Aqueles bares nos quais as pessoas podem falar... os chamados bares a sério e não as discos camufladas de pubs/bar...onde não temos de gritar aos amigos a conversa....
Contudo.... ...começa a chover quando se estava na rua dos Pescadores. Hihihih.. carro longe...o chapéu em casa e a molha foi certa. Na altura ri-me, no sábado de madrugada já não tive tanta vontade.
O meu sábado não foi nada carnavalesco. Tive deitada, porque estava com uma constipação, a ouvir música, a ler um livrito ou outro, a beber os belos dos chás caseirinhos juntamente com as deliciosas torradinhas.
A visita da Glórinha sabe sempre bem. Colocar a conversa em dia. Rir um pouco, partilhar momentos e até relembrar coisas do passado que juntas se viveu.
Parecia que o meu sábado, que negro estava a ser, se tornou mais alegre. A companhia da melhor amiga é o rémedio para a alma. Um deles, como é claro.
Às vezes sinto-me privilegiada em ter uma amiga assim. Faz 16 anos somos unha e carne. E os laços parecem serem feitos de aço. Sabe bem saber que temos alguém que está disposta a todo em nome da amizade.
O meu domingo foi passado grande parte do tempo a dormitar. Acordei tarde, vi um dvd do Almodôvar... fartei-me de rir.... mais uma das suas sátiras à sociedade.
Depois o telémovel toca... a chamada do dia, a mais esperada de todas.... ..... torno a sorrir de novo, neste caso não por algo cómico, mas sim por algo chamado o Bem Estar do coração.
Quando estamos assim... ...tudo, até a porcaria da gripe, parece ser fácil de ultrapassar.. tudo parece ser pequeno... ...e o grande será aquilo que tenho vivido e sentido.
Achava que tinha esquecido estas coisas. Qual quê?? é como andar de bicicleta.... ......
O meu mundo tornou-se inabalável, é verdade. O que antes me fazia "comichão" hoje em dia passa-me ao lado, o que antes eu achava dificil, acho hoje em dia fácil, o que antes eu pensava ser impossível, creio estar ao meu alcance. É... ....digamos que faz parte de nós quando nos sentimos preenchidos. Não na íntegra, falo no meu caso, mas naquilo que ultimamente estava vazio... .....
Enfim isto tudo para louvar a verdadeira amizade...que é capaz de curar por instantes uma gripe e a paixão.... ....que por instantes tira-nos o tédio de cima e nos faz sentir a rapariga mais linda do Mundo .
Hoje em dia posso admitir que a solidão é lixada. Antes, faz ai um mês atrás...se tivesse em casa, sem gozar o Carnaval, sózinha, .... ficaria de rastos, eu Joana Amorim a gaja emotiva ficaria tipo a sentir-se uma formiguinha.
Mas.. ....duas coisas apenas conseguiram alegrar a Joanita que em casa de lenço na mão ficou...eheheh.....
Viva à verdadeira Amizade e à Paixão.

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

....A Bela da macarronada....
umas velas no centro da mesa.
A conversa "mole e lamechas" do dono do restaurante,
o vinho tinto da casa.
A sobremesa deliciosa....
e o vinho entornado num fato. Lol, Lol...

Um sorriso especial,
um olhar penetrante.
Um pegar na mão sincero.... e lembrar o que foi bom no passado.
Esperar mais do futuro... mas ir vivendo o presente.

O bar em Setúbal.... ....o som do Jazz no ar.
Um ambiente à S.Valentim.....
Flores? hummm isso não...não ligo.
Mas recebi algo surpresa e especial.
O belo do poema em papel escrito à mão...

Para terminar: uma bela música a piano tocada pelas próprias mãos.

Será amor?

.... ......diria. encantamento. Conquista. Sedução.

.....depois o pano fechou-se....lol... e a noite fez-se eternamente.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Pós Campanha

Pouco ou nada me pronunciei sobre o aborto.

Mas cá vão agora as minhas achegas, tão sintéticas como sei, ou seja, nada...

A Campanha do "Não" baseou-se essencialmente numa falácia. Não porque os argumentos não sejam válidos. Também eu acalento as minhas dúvidas sobre algumas aberrações comportamentais que a despenalização poderá banalizar. Também eu me apoquento por vezes por não saber distrinçar a linha ténue entre a vida humana e o pouco menos do que ela.
Não. O problema nunca foi esse. O problema é que na verdade nunca discutimos "Abortar. Sim ou não?"- Quem for intelectualmente honesto reconhecerá e saberá que em termos pragmáticos foi o referendo do "Abortar. Como?". E para essas perguntas o "Não" sempre foi estéril de respostas, incapaz de confessar que em ambos os lados da trincheira nunca faltarão úteros cortados pelo crime que defendem com unhas e dentes e refugiando-se portanto na mera guerrilha de princípios que são teóricos e utópicos.
E depois há uma outra coisa que torna este referendo muito diferente de tantos outros referendos e sufrágios que se pudessem concretizar: preserva a escolha pessoal. Nas políticas fiscais, na regionalização, na escolha dos nossos representantes, e em tanto mais, vive-se a tirania das maiorias que necessariamente se impõe ao todo. O aborto é uma escolha de consciência. Não se impõe, em reverso revanchista da medalha da proibição. É profundamente errado que tentemos impôr os nossos valores axiológicos e religiosos, em tudo o que se evada dos mínimos consensuais que sustentam a nossa convergência social, ao próximo. É aliás muito por isso que nunca gostei muito do maldito princípio cristão da evangelização. A História demonstra que poucas coisas são mais perigosas do que idiotas convencidos de executar missões divinas... ... quem tiver a elevação moral e a coragem para não dar esse passo, concordo que muitas vezes egoista- que também não me revejo em determinadas doutrinas esquerdistas da emancipação da camarada "gaja"- concratule-se, experimente a felicidade, da sua generosidade, e da sua tolerância...
Finalmente, fique a minha decepção, pouco espantada, com a abstenção abismal. Estou certo de que quando o Scolari rogar por um cordão humano do Algarve ao Minho todos lá estaremos.
E postos os princípios, 3 parábolas...
A da Sónia, a gaja de direita que há semanas diria votar "não" e depois votou "sim" porque a meditação lhe ensinou uma palavra chamada justiça e essa palavra lhe gritou mais alto do que a palavra "valores".
A do Marco que demoveu a sua mulher católica do "Não" quando lhe perguntou: "Lembras-te do susto que apanhámos há uns anos? Eu queria mandar vir e tu tinhas decidido que abortarias. E agora, o que mudou?"
E a do João que discutia comigo o rescaldo do referendo, ainda ressentido pela derrota da sua causa, que apoia incondicionalmente. E o que ele me disse despertou-me vários sentimentos. Respeitei os ideais embora me preocupasse a sua incapacidade de ver os dois lados da polémica e ademais a intolerância de querermos impôr o que pensamos. Mas o pior não foi isso: Às tantas atira para a mesa um trunfo, ar triunfante: "Sabias que morrem imensas mulheres a abortar?"- Sorri. Nem queria acreditar que o adversário me abrisse assim as pernas para que o fodesse. - "Claro que morrem. E achas que morrem onde? Nas boas clínicas espanholas?" - fez um ar visivelmente envergonhado com algo em que manifestamente nunca tinha pensado. E eu preocupei-me. Que votos de tanta fé e tão pouca ciência nos possam tiranizar a todos.

domingo, fevereiro 11, 2007

Frames

O Cartão da gasosa do pai do Pedro
O McDonalds
Dormir. Dormir muito
Camarões picantes e Martini.
Passear uma Cocker à chuva
Beber, beber muito.
Uma carícia no rosto da Ivy. Um sorriso.
Sim. Sim. Sim. Não acho apropriado festejar. Mas estou contente.
A Inês e o Hamlet enrolados na manta da sala.
Por ora a Disneylandia encerra as portas.
Amanhã reabre a Zurich

Regresso à filosofia numa tarde de Inverno

1 + 1 = 2 ?

E um bando de pássaros mais um bando de pássaros, são dois bandos de pássaros?

sábado, fevereiro 10, 2007

Os convivas

Quando o dia perde a luz, é essa a hora
Dos vampiros despertar nocturna aurora
Em que o fim do que é fértil anuncia
a festa dos perdidos em orgia
Desenganem-se os incautos do sorriso
e da candeia quem pareçam ter no peito
que o estéril no olhar seja o aviso
que nos convivas só o momento é perfeito
Por isso arda a noite queime a festa
da folha caduca em Carnaval
Sejamos-lo agora, porque não?
Que a felicidade essa amanhecerá funesta

Quando se tem segredos profundos tendemos a nos afogarmos lentamente neles. Por vezes deixamo-nos cair lentamente para o buraco.
Ontem acordei com a sensação de que o buraco se tinha tornado grande demais. O chamado buraco negro da solidão. Poucos são aqueles que o partilham. E mesmo quando o partilham penso que se colocam à margem.
Hoje em dia não é fácil abordar certas coisas. Pensamos que os tabus são coisa de gente velha, dos conservadores, dos puritanos, dos mais católicos, dos mais extremistas da moral, contudo em cada amigo/a nos podemos achar grandes atitudes desse tipo, até daqueles mais ousados, dos que julgam que estão à vontade com tudo e com todos.
Posso dizer que na sexta feira sentia-me pesada. Um pouco sozinha enquanto trabalhava. Pensava na minha vida, nas pessoas, nos amigos, no amor, nestes segredos, na familia... ... no Futuro.
Aconchegava-me saber que era final de semana. Iria jantar fora com a pessoa que ultimamente se tornou como que o cerne da minha abstracção. Não o amo. Isso é certo. Ele sabe-o. Aceita. Provávelmente também não me ama. Já amou faz tempos. Deixou-me escapar. Foi na altura o mais sensato. Por vezes as pessoas necessitam de um tempo. Há fases boas e más. Ele teve o auge da má fase. Passou por muito, eu também passei e voltámos a nos cruzar. Como o destino é cómico nestas matérias.
Ontem dizia-lhe, sem ele fazer ideia, que me sentia angústiada e triste. Ele não entendia o porquê. Eu dizia-lhe que existem coisas nossas, intímas que nos pesam muito, e que só nos libertamos delas quando é a hora disso. A minha hora ainda não tinha chegado. Contudo, uma coisa é certa. Tenho sentido um certo sufoco. Até desamparo. Como referi ao inicio os amigos preferem esquecer que um dia eu disse algo... ....preferem muito provávelmente achar que já passou tudo, e que a vida segue em frente.... afrouxam-se nestas coisas. Eu tenho dito....
Se calhar faria o mesmo... ....ou não.
O Quim ontem não percebia o que eu lhe dizia. Devia estar naquela de que estaria a falar uma outra lingua, chinesa só podia ser....
Só sei que compreendeu o meu silêncio, não perguntou mais nada, respeitou-me, respeitou a dor, eu encostei a minha cabeça no seu ombro e ficamos assim um belo e longo tempo. Deitados na cama, eu encostada com a cabeça no ombro dele e ele : "Psiuu....vá descansa... ....descansa... amanhã já passou!".
Hoje é o amanhã. Não me eprguntem nada. Acho que o meu amanhã é algo tardio. Enfim mas estou positiva. A ver vamos, com fé, com amor e muito esforço eu consigo.

O meu professor de Produtos e Mercados de Derivados

Utilizando meios menos simplistas que o desejável, há um simpático cavalheiro que nos finais de tarde de terça-feira me tem tentado ensinar a forma mais rentável de vender coisas que nunca irei na vida comprar. E como qualquer docente em activo no século XXI, faz-se ele acompanhar de um conjunto assinalável de slides Powerpoint, destinados à projecção na tela.

A questão é esta: por muito que desejemos adaptar-nos às novas tendências, há algo verdadeiramente superior à nossa vontade que demonstra não sermos já deste tempo.

Prova n.º1: Usa um ponteiro metálico igual ao da minha professora primária.
Prova n.º2: Ao reparar que um dos slides contém uma fórmula errada, corrige a tela branca com tinta vermelha de marcador.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

As palavras que te direi

Nem sempre as palavras que me transpiram dos lábios querem realmente dizer aquilo que parece que querem. Às vezes porque me perdi no tique vaidoso de encriptar significados a ver se mais alguém os entenda. Outras vezes porque o digo com sarcasmo, humor ou ponta de nihilismo.
Outras vezes o problema nem está em mim que creio que sempre saberei a mais das vezes colocar alguma literalidade nas coisas.
Não.
O problema está em vós!
Recordo a Joana que achava que uma manhã submersa de um episódio negro que escrevi era uma sílaba tónica num banho de imersão.
Ou a Vera que depois de me ler umas páginas ao acaso achava que a coisa era pornográfica.
Eis a coisa...
A morena senta-se à beira da cama, junto à mesa-de-cabeceira. Com os joelhos nus que sobram da saia curta unidos e as mãos que neles repousam. Num compasso olha o chão. Depois ergue os olhos grandes ao homem que junto à janela, de costas viradas para si, abre com vagar os botões da camisa azul. Olha-o ela com uma sensação angustiante e claustrofóbica de inevitável, assim como a olhamos nós com ternura e profunda tristeza do que se adivinha. Filipa é linda. E não precisaria de ter as pestanas reviradas de rimel nem os lábios envernizados de vermelho, nem as maçãs do rosto coradas de falso, como hoje. Tem um rosto moreníssimo, onde lavram pinceladas de castanho de sardas sobre um nariz minúsculo e arrebitado. Os canudos negros emolduram-lhe o rosto e caem-lhe sobre os ombros, nus do top “cai-cai” vermelho. Tira o fio de prata que trás sobre o peito e derrama-o sobre o tampo da mesa. Depois tira o top e o soutien de renda igualmente tinta. As roupas caiem no chão. Filipa treme. O homem vira-se finalmente e deixa que os olhos caiam em faísca ao peito despido. Fala sem esquivar os olhos do deleite das mamas, desinteressados os seus dos olhos da morena. “És de facto um pitéuzinho. Mas olha lá, que idade tens?”; “Dezoito”- Filipa baixa de novo o olhar ao tapete felpudo cor-de tijolo.- O homem afaga o bigode- “Terás mesmo?”- a morena olha-o de baixo para cima e acena que sim. É um indíviduo encorpado. Relembra-lhe o pai, mas mais alto. Com aquela barriga rosada em que parece que o peito se apoia, a surgir sob a camisa aberta. Acha-lhe a pele enrugada, e pensa que parece que tem, sob essa, carne que foi batida. Não é por aí além gordo mas parece que a massa muscular se lhe entibeceu em puxadas flácidas que lhe pendem na pele. E sua. Tem o cabelo ralo oleoso do suor que escorre pelo pescoço e molha a camisa. O homem com as mão desabotoa o cinto castanho em que o couro se entrecorta em escamas. Os dedos grandes libertam o primeiro botão do tecido cinzento das calças de fato mal vincadas.- “Tira lá isso, que te quero montar.”- Filipa estremece interiormente. Não sabe se o homem terá dado conta. Provavelmente não se interessaria ainda que assim fosse. A sensação de contagem decrescente para a dor é um ritual de angústia. Há espinhos que se nos cravam sem que tenhamos dessa sensação aguda pré-aviso. Mas muito pior é sabermos exactamente para quando a dor tem agenda marcada. Contarmos os minutos, os segundos e os instantes indivisíveis do tempo que antecedam a nossa provação, imóveis, indefesos. O cérebro corre rotinas desesperadas de intelectualização de uma fuga mas no fundo sabemos que a mesma inexiste. Trata-se apenas de fazermos o melhor que pudermos por nós mesmos. Domar o cavalo selvagem que nos galopa no peito e deixar que a nossa alma se evada do corpo se certo é que o corpo não se evadirá da provação. O duelo mano a mano do ser humano com o seu medo mais concretizado, o paradigma do pensamento perfeito para a caminhada do condenado. De resto, melhor ou pior, suportar o inevitável. E o inevitável de Filipa é aquele homem grande de meia-idade que se perfila perante ela nu, para além da camisa azul aberta com a mão que masturba e os dentes amarelos que sorriem. A rapariga conforma-se, ou tenta conformar-se. Agora não há caminho de regresso. A bifurcação no trilho em que ainda poderia ter desisitido e esquecido ficou no momento em que o homem pagou as Caipirinhas no Skinframe e se levantaram ambos na direcção das escadas ascendentes. Agora não. Agora o tempo que mentes a ti de que ainda falta são alguns segundos. Não, nem isso. O tempo acabou-se com aquele primeiro calafrio de quando te caiu o soutien do peito. Agora apenas falta deixar acontecer. Pensa nisso melancólica, enquanto se desenvencilha das cuecas vermelhas. Preferia não saber que o homem atirou a camisa sob o sofá e dá um passo final na sua direcção.

Com um movimento súbito de mãos grandes, as mãos afundam-se no cabelo e agarram a rapariga pelo crânio. Depois puxa-a e empurra o pénis erecto em colisão com os lábios. Primeiro cerram-se os maxilares e a cabeça quer esquivar-se. Negação desesperada, que aquelas mãos a imobilizam vigorosa. Não resistas Filipa, deixa-te ir. Em breve o asco daquele cheiro azedo e do sabor que vais sentir se chamará banalidade. Quando uma fonte se deixa exaurir, não correm mais lágrimas. É por isso o sexo do homem lhe entra pela boca de lábios de menina, em movimentos ritmados. O homem fecha os olhos e respira fundo. Filipa domina o vómito e provavelmente já não pensa em nada. Está só ali, sem prazer nem dor. Apenas aquela sensação vaga de repulsa que os minutos de que vai perdendo a conta diluem. Fecha os olhos, o abstracto do que não vê reconforta-a. Pensa que não está ali aquele homem que fede a suor, com aquele pénis curto e gordo que se lhe roça na língua. Quer pensar que beija a boca carnuda de Miguel e que é a língua doce do namorado que já não tem que dança com a sua. Se cerrar os olhos, muito, muito fundo, talvez isso se materialize. Mas a cada gemido do homem as paredes da alienação frágil se desmoronam e Filipa entrevê desfocado aquele pénis, aquela barriga e aquele escroto enrugado - “Chupa, puta, vá mais fundo.”. Mais vale sonhar com o nada. Entre o nada de Filipa e a Filipa que fela o homem da barriga rosada, diluir-se uma na outra, não é assim tão improvável. Por isso, cativa na cadência a que obrigam aquelas mãos de homem, Filipa aprende a voar. Em breve terá dinheiro para fugir daquela casa velha de paredes descascadas e bolorentas. Tudo se resolverá. Ajudar a irmã e o pai a pagar tudo e quem sabe voltar a ter uma vida normal. Isso um dia. Não sabe bem quando, se Deus ajudar, talvez uns meses. Um ano, não sabe. Mas amanhã irá compensar-se com um prazer simples. Poder pagar de novo um bilhete de cinema e comer um gelado sem que não mingue o que jantar. Fechar-se na sala escura e esquecer-se do mundo cá fora, em que a partir de hoje é prostituta. Enquanto a sua vida é um pesadelo, sonhará com vidas de celulóide melhores que esta, em que os homens cheirem a canela. E um dia o pesadelo acabará. Ninguém precisa de saber. É apenas um desvio no rumo dos seus sonhos. Um dia voltará a estudar. Fazer Química e entrar para Medicina. E ter sonhos, sem vergonha de se sentar com os amigos no café. Gostar de um rapaz lindo que lhe chame Pipa e não puta e que tenha um beijar a saber a açúcar. Sim, Filipa há-de esquecer o sabor azedo daquele pénis na sua boca.

Cambalhota que não se espera. Uma mão empurra-a deitada sobre a cama em que se sentava enquanto a outra a faz virar sobre si. Sente todo aquele peso abater-se sobre ela. Ver o creme do espaldar da cama ou o negro dos olhos cerrados? Tanto faz. Sente a pele das nádegas a esticar-se, contrárias ao seu instinto de pânico que lhe traz todos os músculos contraídos. Depois sente a dor que a penetra de um impulso só. O corpo suado sobre o seu. A mão que lhe puxa um seio até à dor. Tenta respirar fundo. É apenas sexo. Este estranho como Miguel, o seu corpo aceitará ambos. Já ali tão perto está o escuro da sala de cinema. Só que agora num malabarismo das suas imagens mentais se varre o cinema e Miguel e os sorrisos de ontem e de amanhã. Crê-se fora de si a ver aquele velho gordo a usá-la como um pedaço de carne e a murmurar-lhe que a sua cona é bem riginha. Aquele hálito a tabaco e a cachaça e os fluídos daquele homem que se entranham em si. Soluça. Adivinha-se que chore.- “Anda lá, vou-te comer a peida.” – a voz sussurra-lhe ao ouvido. Filipa toma-se pânico. “Não!”- Foi tudo muito rápido. Sentiu a vagina aliviar-se e depois uma dor violenta que a rasgava. Até ali doía-lhe sobretudo a alma. Mas agora é o seu corpo que se desfaz. Grita. Um grito nado morto de uma mão que lhe amordaça a boca, empurrada que é a sua cabeça contra a almofada, ao ponto de quase sufocar- “Está calada caralho! Ainda vão a pensar que te estou a dar uma trepa!”- Outro braço toma-a pela cintura e puxa-lhe as nádegas de encontro ao corpo do homem. Chora. De humilhação. Sobretudo de dor. Choro que a almofada abafa assim como se deixa ensopar. Aqueles minutos pareceram horas. Até que sente correr a ejaculação dentro de si e o corpo aliviar-se. Depois caiu morta como um despojo sem valor nem préstimo. Sem coragem de tirar a cabeça do jugo da almofada. Já sente o som de roupa que veste o corpo do outro. “Foda-se, que és bem riginha. Ouve lá pitéu, andas na vida há pouco tempo...?”- conta as notas- “Para a semana quero essa peidinha de novo. A fruta come-se enquanto está fresca. Vá que eu pago bem.” – e a carteira pinga uma nota de 100 Euros para lá do contrato. Filipa só soluça. É um choro abafado que faz chiar o peito que tem que conter dentro a tempestade que não se consegue libertar. O homem bate a porta sem cerimónia.


Amazing Grace, how sweet the sound,
That saved a wretch like me....
I once was lost but now am found,
Was blind, but now, I see.
T'was Grace that taught...
my heart to fear.
And Grace, my fears relieved.
How precious did that Grace appear...
the hour I first believed.
Through many dangers, toils and snares...
we have already come.
T'was Grace that brought us safe thus far...
and Grace will lead us home.
The Lord has promised good to me...
His word my hope secures.
He will my shield and portion be...
as long as life endures.
When we've been here ten thousand years...
bright shining as the sun.
We've no less days to sing God's praise...
then when we've first begun.
"Amazing Grace, how sweet the sound,
That saved a wretch like me....
I once was lost but now am found,
Was blind, but now, I see.


Sara desperta sobressaltada com o som dessa porta que se batera no seu sonho. Ao seu lado, na cama pequena que serve as duas irmãs, a metade esquerda está vazia. Não sabe bem porquê, mas o coração oprime-se-lhe.

Cabeleireiros de acolhimento provisório e outros dramas de um orfão que desaguam no dia de hoje e na era dos "Morangos com Açúcar

Nunca regresses aos lugares onde foste feliz. Essa tarde em que decidi experimentar a competência da cabeleireira que tomara de trespasse o negócio à Cristina revelou-me isso mesmo. Não foi bom . Também não foi mau. A Cristina e a quimica que escorria entre nós- tanto quanto pode escorrer entre um gajo meio dandy mas straight e uma lésbica- aquela em que eu dizia com o meu ar despegado das coisas- porém sensual- "Cristina, o costume..."- era passado. Kaput. Ali já não havia nada para mim. Era o primeiro dia do resto da minha vida.
Andei perdido. Entreguei-me sem afecto a várias cabeleireiras e mesmo a alguns cabeleireiros. Affaires de uma só vez. Sem reter nomes, sem tecer afectos. Relações fugazes, cortes de cabelos coloridos. Vazio...
Entretanto o tempo galopava inelutável. Veio a moda do mohicano, das cristas, dos penteados "casual" e sei lá eu mais o quê. De repente os penteados afro eram de novo moda e os gajos pintas exculpiam à maquina tatuagens capilares em forma de coriscos a rasgar as fontes. Até o mullet hair que ainda há poucos meses seria sinónimo de provinciano algures do Arkansas, aquilo que a malta do nuorte chamaria de "azeiteiro" era agora de conotação stylish.
E também o Rui evoluia portanto, a um ritmo não tão frenético como os oppinion makers da moda, mas o Rui evoluia.
Até hoje.
Assentei. Não é amor. Não é a magia da cumplicidade com a Cristina aos 16 anos. Mas embarquei numa relação estável com uma cabeleireira cá do bairro. É uma mulata bonita com um pé no balzaquiano, mas não tanto que se esquive de agradar ao Rui que prefere as suas mulheres magras mas que também não é esquisito ao ponto de não lhe apreciar as formas generosas pelo espelho.
Mas não é só isso. Desta relação adulta frutificou um corte de cabelo arrojado. O Rui é agora "casual" e usa um corte de cabelo "curto e turbulento à la morangos com açúcar". Mandou passear a franja, aceitou as suas entradas e os seus abanos de braços abertos. O remoinho... ... que interessa o remoinho quando o cabelo anárquico está na moda?
A mãe não aprova a relação e não quer dar colo ao neto.
Mas a maturidade dos afectos trinfará.
Até que venha a próxima moda, até que revolucione o próximo corte.
A todos...
A minha vénia
:o)

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Gostar de ti

Vem tudo a propósito do que li hoje num blog da vizinhança, de que sou cliente.

A Luna, apenas lhe conheço o nome de guerra, confessava a estranheza de que um outro vizinho qualquer da blogosfera a atrai. Alguém que ela nunca viu, com quem nunca falou e no entanto... ... o gajo mexe com ela, insinuando-se com as suas palavras escritas no seu próprio feudo bloguístico. Entendamo-nos, eu pelo menos creio que assim entendi. Ele é inocente da sua própria sedução porque eventualmente nem sonhará que a Luna existe e que a Luna sonha que ele exista quando lhe lhê os pensamentos impressos no ecrã. É apenas um estranho com o dom da palavra e da ideia que faz cavalgar uma estranha forma de "desejo de ti" numa estranha. E isto é estranho?
A vida ensinou-me a não julgar demasiado. E por isso o carimbo do estranho é algo que eu prefiro que ganhe pó na prateleira das classificações. A mais das vezes não o uso.
Ontem alguém me dizia. "Mesmo sem te conhecer tinha um fetiche por ti. Pelo que eras." - eu menti e disse que era absurdo. Mas não é, bem sei, desculpa a mascara céptica que ontem me apeteceu usar, amiga.
É poético. Tem que ser contido a limites de se saber que se sonha. Mas é poético.
Nesse linho intrincado que é a vida, provavelmente, algures na cidade, alguém lê os textos da Luna e sonha como seria cruzar o olhar com essa estranha que se bate pela despenalização do aborto como a mais arguta das varinas, graceja do abandono da sua vida amorosa... ... e sonha...
A nós, sonhadores, um brinde!
:o)

O Luto progressivo do meu cabelo e de como ao fim de contas fiquei orfão

O curso de Direito progredia. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde o cabelo seria um pouco como a juventude, a ter que definhar, certamente mais breve do que esta. A cada corte inovava-se. A bem dizer, cortava-se mais um pouco. Dentro em breve já não era exactamente o que se pudesse definir como um "corte comprido". Eu prefiro o conceito de tigela fashion, assim a modos de que com algum gel e uma colocação estratégica para lá das orelhas pudesse parecer um corte ainda mais clássico do que o era de facto. O último bastião da resistência já nem era eu, entusiasmado com as incursões da Cristina na frente de combate, com o seu estilo másculo de tesourar, infligindo derrota após derrota ao meu cabelo, mas poupando o meu ego. Não, o último bastião chamava-se Elsa, uma gaja girissima de nariz pintalgado de sardas e que tinha algum peso no assunto uma vez que era a minha namorada de muitos anos. A Elsa gostava de várias coisas mais do que realmente gostava de mim. É um facto. E de entre o rol dessas coisas que me superavam lá estaria também o meu cabelo. E por isso limites mínimos teriam que ser respeitados. A tigela fashion era o compromisso possível entre as partes beligerantes.
E assim foram os ponteiros dando voltas frenéticas na roda do tempo. Deve ter sido por 2001, 2002. Eu já não me recordo bem. O curso terminado, advogado reconhecido e agraciado pelos seus pares da Ordem, o Rui construia os primeiros anos da sua carreira como quadro da Z. Tinha uma imagem conservadora q.b.- sem dúvida mais que hoje - o fato no horário laboral e uma imagem contida de smart casual no que sobrasse das suas rotineiras semanas. Por essa altura a namorada já era passado, Sabina raptada por algum imbecil com um cabelo ainda mais brilhante que o dele, e por isso o Rui autorizara-se a cortar a sua tigela fashion ainda mais curta. Assim, um penteado que fundia o melhor da tradição dos colegiais de Oxford ou Cambridge com algum sentido de modernidade. Mas havia limites cautelosos que não se transpunham, tabu personificado de medos. Sob a alguma espessura de cabelo que sobrevivera à lei madrasta do tempo repousavam os demónios adormecidos de orelhas de abano mutiladas, remoinhos que se eriçariam em jeito de felino acossado e agora- a idade não perdoa- reconhecia-se a cavalgada lenta mas inequívoca de duas entradas colossais a rasgar a fronte que urgia esconder sob a franja- a tal de colegial.
Em algum sentido o Rui permanecia fiel aos hábitos do míudo que o Favinha há tantos anos cortara com a sua lâmina sedenta de sangue. Continuava a ser o gajo que cortava e depois deixava crescer longamente a touca, até que lhe incomodasse estudar os processos com a franja a entrecortar-lhe a visão ou que, pior (!) catástrofe, calamidade... ... a lingua maledicente do seu irmão ensinuasse que começava a ter o cabelo à playmobile- categoria técnica que define o penteado típico de um betinho irritante de Cascais, todo vestido de Sacoor. E aí o Rui apressar-se-ia na rota da salvação que se chamava Cristina, e que até hoje está para se comprovar se seria lésbica.
Foi num desses dias que o céu desabou e que as certezas que pensamos que sejam amarras da nossa tranquilidade se desmoronaram. Devia ter sido uma tarde como qualquer outra. Viera um pouco mais cedo da Z e ia cortar o cabelo. A rotina dá-nos esta tranquilida. Aquela da aparência de que a felicidade é eterna e que os nossos afectos sempre nos sorrirão.
Mas não é assim. O ocaso espreita a humanidade e a má fortuna decepa os laços de amor tantas vezes de forma abrupta e desumana. Naquela tarde foi assim. Luzes apagadas. Ar abandonado. Um aviso na porta anunciava o fim da actividade da Cristina e o trespasse com reabertura anunciada por uma estranha. E restava eu ali à porta do palco das minhas memórias. Um fantasma mal querido pelo presente, deixado sem sequer uma palavra, um bilhete colado no frigorífico, uma "Dear John letter". Nada. A Cristina abandonou-me sem uma palavra. A mim e ao meu irmão que lhe tinhamos chamado nossa (cabeleireira).
Nem sei bem o que senti nesse dia. Nem sei bem o que tenha balbuciado atónito. Suponho que tenha sido um "Pôrra, e agora...?"
Só sei que caminhei a calçada para longe dali, a querer prometer a mim mesmo que não olharia para trás. Promessa que quebrei...
... mas essa é outra estória, a do derradeiro capítulo desta obra capilar a que chamaremos carinhosamente "Cabeleireiros de acolhimento provisório e outros dramas de um orfão que desaguam no dia de hoje e na era dos "Morangos com Açúcar"

A pressa

Sagas de quando se tem pressa....
É verdade, a pressa não é amiga de ninguém. Quanto mais depressa mais devagar. O ditado aplica-se e bem, nunca falha.
Ontem à pressa ia perdendo o passe...lá iam 45 euros para o olho da rua. Depois noutras pressas... lá se foram os belos dos collants da Étan...
"Que raios"- pensava eu. Hoje tudo de mau me acontece.
Lição: não adianta correr. Porque isso só vai atrasar noutros aspectos.
Dizia eu ao Quim: " Céus.... ....já devia estar em casa porque amanhã é dia de trabalho, ainda tenho que engomar!!!" Ele respondia a rir: " tem calma a noite ainda é uma criança!"
Nova lição:" quem leva a roupa à engomadoria não sabe o que é o trabalho de passar a ferro à 1 hora da manhã.
... HOMENS!!!!!!!!
O que é certo é que ontem nada correu como queria... ...eheheh enfim....

RP, o Pastor de almas

Dizia às minhas gajas que se calhar andavam a dar umas cabeçadas insensatas. A dar confiança imprudente a gajos da noite, sem interesse nenhum. E que no fundo era isso que estava de alguma forma a corroer-lhes o valor que têm e dos sentimentos que as entreligam. A noite corrompe se for esta e não nós a ditar as regras.
E a Vera sai-se a dizer que não posso falar, que tenho culpas no cartório. Se não me mantivesse ausente nos meus malditos retiros espirituais, provavelmente teria segurado melhor as pontas, dado algum rumo à coesão da tribo e mantido os predadores mais distantes.
LOL
Como é que uma só frase pode ser ao mesmo tempo uma crítica injusta e idiota e um elogio?
P.S. Enquanto escrevia estas linhas o meu Hamlet caíu de cima da mesa. Que gato tão tosco, o meu

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

A gentil arte da retórica. Ou se tem ou não se tem. Por exemplo: em o "O que tu escreves é divertido [bla bla bla] mas um bocadinho chato", o segredo do sucesso poderá estar numa escolha certeira do palavreado intermédio, aqui descrito como "bla, bla, bla". Sereno, apaziguador e suficientemente longo, de forma a dificultar ao máximo o reconhecimento de uma ligação directa entre o elogio e a satisfação da necessidade. Geralmente feminina. Mas também as crianças mostram, com bastante à-vontade, a sua perícia na matéria: "Ó mãaaee... gosto muito de ti! Olha, hoje a professora ensinou-nos os números romanos até 500 e também os reis e... também outras coisas.... Olha... posso ter uma Playstation nos anos?".

Outra das grandes finalidades deste tipo de recursos pode ser a persuasão, mas com vista ao desenvolvimento de uma estratégia de marketing pessoal, como é o caso das entrevistas de emprego, onde o candidato é convidado a evidenciar alguns dos seus defeitos: "Bom, considero-me um indíviduo por vezes teimoso. Digo-o, na medida em que faço prevalecer, com firmeza, os meus pontos de vista quando acho que estou certo". Desta forma, o indíviduo evidencia segurança, afinco, e um certo espírito de auto-crítica, amenizando porém o traço psicológico com a utilização da expressão "por vezes", e retorcendo o argumento inicial, transformando o defeito em qualidade: "Só quando estou certo!". Em 4 segundos, o sujeito, inicialmente comparado a uma reles mula, evolui para um estádio superior onde é capaz de reconhecer o lado da razão e bater-se pelos valores moralmente superiores.

O problema é que algumas destas técnicas vão-se tornando banais, e caindo em desuso. Como em qualquer ciência, os paradigmas rompem-se. Evoluímos. E no desenvolvimento do método do discurso pode estar um lugar no coração do chefe ou uma playstation no próximo aniversário.

A semana começou e já estou derriada. Estou que nem posso. A segunda feira começou bem cedo no Tribunal de Almada. Mais uma situação de "desobediência" chamava por mim... ...lá estaria eu, defensora oficiosa, a fazer o meu trabalho que pouco ou nada iria ajudar.. Há casos assim... sem voltas a dar.
Depois de uma manhã de trabalho, e à espera da Juiza cerca de uma hora, segui rumo a Lisboa. Não é facil saltitar de Comarca em Comarca. Creio que quando tudo se faz na mesma zona a dificuldade é menor, bem como o cansaço.
Perto da 13h30 estaria a entrar ao trabalho na Av. da Liberdade. Tal avenida quase que se tornou uma segunda casa. Entro lá antes das 9 horas e saio depois das 18h. Há dias que pedem para lá ficar, outros nem por isso.
Depois de um dia de trabalho o normal seria ir para casa relaxar. Mas não. O estágio, que só acaba em Junho, exige que ainda tenha que ir para Almada atender clientes. Ora a minha jornada de trabalhito termina, por vezes, depois das 21h, 22h.
Hoje... consola-ame o facto de no regresso ter atendido o telefonema maravilha do dia. EHEH...dá forças, ânimo, dá-nos um sorrir bonito e contagiante.
Enfim... ...tudo para dizer que o trabalho é imenso, mas um simples telefonema de quem é importante nos faz esquecer que por momentos o dia se tornou longo demais.

domingo, fevereiro 04, 2007

Sebentas da Guilda

Recebemos queixas de que os nossos posts são divertiiiiiiiiiidos mas longos demais e por isso um bocadinho chatos. Bom, sem nos lançarmos a entender se o elogio é sequer compatível com a crítica, vamos pragmaticamente tentar resolver o problema desse público alvo, lançando aqui as "Sebentas da Guilda", para que a Catarina e outros que tais que se revejam na sua opinião, se possam sentir satisfeitos.
Em resumo...
O Rui teve um barbeiro que quase lhe amputou uma orelha, outro que lhe fazia cortes de cabelo totós, e uma cabeleireira fufa com muita pinta. Certo dia foi a outra cabeleireira e a grandessíssima vaca fez-lhe um corte de cabelo literalmente de gaja.

O fim da era do Grunge durante as férias da Cristina e como isso contribuiu para que eu parecesse uma bicha tonta

Algures por 1995, 1996, a moda dos cabelos compridos chegava ao fim ou, pelo menos modificava-se. As fartas cabeleiras masculinas começavam a aparecer uma após outra liquidadas. Mas eu cá ainda não estava psicologicamente preparado para abdicar da minha. Eram muitos anos habituado aquela imagem, sobretudo seguro com aquela imagem. Eu não fazia bem ideia sobre que gajo me iria aparecer quando desatasse a cortar. Mas uma coisa era certa: aquela cabeleira, longa e farta a tocar os ombros por inteira era chão que já não dava uvas. Portanto era preciso conseguir um compromisso entre a evolução e a manutenção...
Era tempo de olhar de novo para o que os ícones pops nos trariam de novo em termos de sugestões de cortes de cabelo. A moda curta e ridícula dos pastilhados com as suas calças aos quadrados, franjas puxadas com gel para a frente e patilhas em bico tinha sido efémera. Mas perene tinha ficado a influência do que eu definia como o penteado à jogador de futebol: curtinho, engelzado e com patilha em bico. Mas não era para mim... ... eu preferia a evolução que os cabelos compridos tinham tido por essa época: mais curtos e escadeados. Olhava para o Jon Bon Jovi, para o gajo dos Gogoo Dolls, para o novo corte do Eddie Vedder, só para citar alguns. E pensava, sim, é isto que eu quero. Próxima tosquia, vai pedir um briefing com a Cristina.
Só que no dia escolhido, meto pés a caminho do seu salão e esbarro com uma surpresa: "Encerrados para férias. Reabrimos dia..." - fogo, ainda estaria ausente 15 dias! Nem pensar que a minha ansiedade de experimentar o meu visual novo esperasse 15 dias. Era como um brinquedo novo e eu queria abri-lo naquele mesmo dia! A Cristina desertava pela primeira vez a melhor tutela dos nossos interesses e eu, vingativo, saltaria a cerca da fidelidade conjugal... ... Deus, como pagaria caro o meu pecado...
Onde ir? Era como um novato do Red Light District a querer eleger uma rameira e a nem saber muito bem como a abordar para negócio. Acabei por passar à porta de um que me pareceu bem: "Nando's", ar moderno, umas poucas cabeleireiras atarefadas, unisexo e tal. Era já ali.
Entrei e quis explicar como raio quereria o cabelo. O melhor que conseguia explicar era que o queria comprido escadeado. À época minguava-me a coragem para levar uma foto ou dizer uma bizantinice como "Eu quero o cabelo como o do Jon Bon Jovi". E portanto lá dei as minhas explicações como pude, ausentes de referências que me envergonhassem. E a gajita começa a cortar e a meter-me ganchos no cabelo. A Cristina jamais me metia ganchos no cabelo e isso levantou-me suspeitas. Mas bom, meditava eu, a Cristina é fufa, deve ser coisa de fufas não usar essas mariquices. E ela lá ia avançando, com ganchinhos e tesouradas... ... quando acabou e me olhei ao espelho... ... como descrever? O meu coração partiu-se! Tinha um muito feminino corte com franja e cabelo escadeado a emoldurar o rosto, como uma qualquer sopeira em dia de casamento. Eu nem sabia o que dizer. Ela ainda teve a lata de me perguntar se gostava! Aquela gaja, devia ter trabalhado até ali num salão de cabeleireiro algures numa vilazeca beirã ou assim.
Saí de lá taciturno. Arrependido. Com vontade de ligar à Cristina e lhe implorar perdão. Mas estava feito. Que fazer? A minha mãe ao chegar a casa ainda mais fundo cortou a ferida que me dilacerava a auto-estima. Primeiro horrorizou-se espantada. Depois riu a bom rir. O meu irmão foi directo ao riso.
Eu tinha duas hipóteses: voltar ao cabeleireiro, a outro, pois claro, e cortar de vez. Ou então disfarçar, de alguma forma camuflar que parecia uma gaja. Como não estava psicologicamente preparado para o plano A, optei pelo plano B e tentei disfarçar o melhor que podia aquilo com muito gel... ... em vão. Após uma primeira meia hora de convívio desatento, os verdugos da faculdade identificavam o Wally. Dizia o Alain, "Epá, agora estou a reparar, que merda de cabelo é esse?" - em minutos, segundos, inventava-se a alcunha de Catarina Furtado que me ficaria tatuada na pele, ou neste caso no couro cabeludo, por muitos e penosos meses, muito para além do tempo de vexame, duas três semanas, que durou realmente aquele triste corte de cabelo.
Mas tudo está bem quando acaba em bem. A Cristina voltou e lá me fez com as suas tácticas dolorosas mas mestras o meu corte de cabelo escadeado que usaria por ainda algum tempo.
Mas nada é eterno e por isso uma época caminhava para o fim. E é por isso que no próximo capítulo los falarei d'"O Luto progressivo do meu cabelo e de como ao fim de contas fiquei orfão"

As penas de ter uma cabeleireira lésbica, poupas, gel, e frio nos abanos.

A Cristina... A Cristina usava o cabelo à rapazinho, vestia à rapazinho e comportava-se essencialmente como um rapazinho. Sempre parti do princípio de que fosse lésbica, embora também nunca ninguém mo tivesse afiançado. Tornei-me rapidamente um dos "habituais" da Cristina. Gostava dela. Tinha paciência para entender todas as inovações que eu lhe quisesse explicar, até que as mecanizasse para que eu me pudesse sentar na cadeira e dizer: "Cristina, corta como de costume."- aliás, mesmo quando a Cristina arranjou uma assistente, tentaria que fosse ela própria a atender-me ou pelo menos estaria vigilante a dar instruções: "Corta mais assim, faz mais assado, olha que o Rui não gosta de máquina. É bom podermos entrar numa casa onde sejamos clientes, tratar o dono pelo nome e pedir "O Costume". Faz-nos sentir que existimos e somos acarinhados naquele tecido social. E no salão da Cristina, nos muitos anos que lá fui, foi sempre assim. Tentar-me-ia sempre encaixar na agenda, mesmo que aquilo estivesse ruim e de cada vez comentaria para as clientes, que o salão da Cristina já era um moderno cabeleireiro unisexo, "o quão lindo e forte era o cabelo deste míudo". E a Cristina também conhecia os segredos todos: o meu remoinho que convinha não apoquentar, o gosto pela alguma patilha, etc, etc, etc... ... confiava-lhe o meu estimado cabelo de coração aberto!
Foram muitos anos. Muitas fases. Primeiro troquei o lado ao risco e deixei crescer uma poupa que se encrispava vaidosa e reluzente de gel no alto da testa. E abdiquei do cabelo "cheinho" de lado que a mãe me recomendava para esconder as orelhas que teimavam em ser de abano. Saía ao fim de cada corte com frio nas orelhas e os míudos na escola gozariam com a forma aberta das ditas (e não esquecer que uma era uma hedionda orelha mutilada de Mr. Spock). Mas não fazia mal, porque eu até era um puto giro e o que perdia a mostrar as orelhas, compensava-se no sentido do cabelo fashion e brilhante de gel que eu usava. Até porque eu tinha uma cabeleireira lésbica para ninguém botar defeito no meu staff, ah pois era!
O Mundo caminhava para os anos 90. Dentro em breve Nirvana, Pearl Jam e Alice in Chains empurrariam o Hard Rock dos Guns da Spotlight. E quem não deixou crescer uma enorme guedelha com os primeiros, não resistiu à vaga dos segundos. Vestiam-se calças uniforme e camisas de flanela e calçavam-se botas Sendra. Mas sobretudo os rapazes passaram todos a usar longos cabelos pelos ombros. E entre eles lá estava o Rui que já só em casa era Pedro. Como sempre assistido pela sua fantástica cabeleireira e pela sorte de ter nascido com um cabelo forte e brilhante, que ao se tornar comprido ganhava naturalmente os reflexos caju que as gajas andam por aí a pintar. Mais do que nunca a Cristina cantaria odes ao seu cabelo junto das suas clientes e recomendaria cremes. Foi uma fase em que a Cristina caíu no entanto em alguma obscuridade dos seus dotes. Afinal o Rui requisitaria os seus serviços de tempos a tempos e apenas pediria "Corte dois dedos a direito...". A coisa não tinha exactamente ciência. Mas como o bom jogador é aquele que também veste o fato de macaco para as exibições discretas mas úteis, a Cristina estaria lá sempre a dizer: "Presente."
No entanto a medalha tinha o seu revés... ... a uma cabeleireira lésbica não pedes carinho, não pedes a ternura de uma mãe, de uma esposa devota. Não! A uma cabeleireira lésbica pedes que te diga "Míudo, vou-te fazer aí um penteado que vais pôr o gajedo todo de pito aos saltos!"- Sim, porque ela também percebe o teu desejo. Caramba! Vocês são amigalhaços e os amigalhaços tratam uns dos outros. Mas não fazem festinhas carinhosas a dizer "Tem doi-doi?" - E por isso a Cristina fazia-me sempre passar as passas do Algarve, no seu modo brusco e sem dó de me puxar o cabelo que estivesse empeçado, de às vezes me picar com a tesoura e de me esfregar o crânio como quem esfrega roupa encardida contra a pedra do tanque com um pedaço de sabão azul...
Só perceberia o quão bruta era a Cristina quando anos mais tarde, o destino me levasse a bater à porta de outros salões de cabeleireiro.
Mas isso é outra estória...
Próximo capítulo: "O fim da era do Grunge durante as férias da Cristina e como isso contribuiu para que eu parecesse uma bicha tonta"

sábado, fevereiro 03, 2007

O Barbeiro Manel e a Era do "Chapa 5" da Barbearia do Largo do Tribunal

Em 1983 sai o primeiro prémio da Lotaria ao meu pai. É verdade. O prémio não faz dele um excêntrico mas agora já pode cumprir o velho sonho de viver no centro de Almada, onde o Eudardo e a Guida cresceram. E assim o Pedrinho muda de ares. Quando se tem sete anos, a nossa autonomia é curta demais para decidirmos conservar o que quer que seja do que deixamos para trás. E por isso tudo muda na vida do Pedro: muda de escola, perde os amigos da rua- não se pode dizer que mude já que nunca conseguiu fazer um só amigo nesse novo sítio para onde o levaram- muda de papelaria onde compre pastilhas e cromos e de pastelaria onde pedinche bolos à mãe. E, claro, muda de barbeiro. A minha relação com cabeleireiros foi quase sempre monogâmica. Quando o namorisco cede lugar ao casamento, normalmente o amor protela-se até que qualquer coisa como uma mudança de casa nos separe.
O senhor que se segue, seria o "Manel". O Manel, se bem me recordo era o ex-sócio do favinha. Só não me lembro se o Manel tinha abandonado o Feijó ou o Favinha é que teria largado Almada. Pouco importa. As duas barbearias era em quase tudo iguais e tudo no Manel fazia lembrar o Favinha: a decoração da loja, o estilo quadrilheiro com que tesourava enquanto cavaqueava com os clientes, a clientela, as calças de tecido justas, a camisa de botão aberta e o cheiro a desosorizante que me vinha das axilas enquanto o Manel ou o seu assistente me cortavam a juba.
Era uma lojeca pequenina: suponho que ainda labore, junto ao Largo do, agora antigo, Tribunal de Almada. Sempre achei tranquilo estar lá sentado e olhar a rua, uma rua de árvores frondosas. Uma rua cinzenta mas com qualquer coisa de acolhedor. Tão pouco na era do Manel eu me apoquentava muito com cortes de cabelo. O Manel também pouco mais saberia do que variações ligeiras do "chapa 5", o que não era grave porque neste caso o cliente não saberia querer mais do que isso. O "chapa 5" é o corte clássico à rapazinho, que não honra nem compromete e era sempre aquilo que eu de lá trazia, já se sabe até que o cabelo crescesse de novo e eu voltasse lá.
E a nossa boa relação durou uns anos. O Manel conhecia a gaffe do ex-sócio e teria sempre o cuidado de não me estragar mais as orelhas, e de me deixar uma patilhazita de cabelo, como eu gostava, e de não acordar o remoinho de cabelo que tenho na nuca, pelo simples processo de não cortar muito por essa zona. A nossa relação era como um casamento morno em que o sexo não é bom mas também não é mau. E eu era como a esposa virtuosa que por nunca ter provado do pecado, também não achava que o "chapa 5" fosse insuficiente.
Até que despontou a puberdade e o Pedro, que agora já era o Rui, começou a olhar para o espelho e a achar que aquele risco ao lado caído sobre a testa de menino bem comportado já não o fazia feliz. Tímido, lá pedia isto ou aquilo ao Manel. E o Manel dizia que sim. Só que o Pedro achava que pedisse o que pedisse, saia de lá sempre com o mesmo penteado. O "chapa 5"...
O Mundo é pequeno. E por isso foi o Eduardo quem arranjou emprego ao Pedro Rafael, o filho do Manel, lá na Contabilidade da Z. E por isso o Pedro Rafael começou a frequentar ocasionalmente a minha casa quando o "chefe" desse um almoço e convidasse os seus pupilos. O Pedro Rafael era, ainda é, um verdadeiro "pintas". Gajo grande, bem parecido, cheio de look. Um dia comentou-se num desses almoços que toda a família, menos a mãe, claro, cortava o cabelo no Manel. O Pedro olhou-me- eu teria, 13, 14 anos- "Puto, tu já não tens idade para cortar o cabelo no meu pai. Precisas de uns cortes à maneira e ele não sabe nem quer aprender mais do que o "chapa 5" - o Rafael também conhecia o conceito - olha, tu vai à Cristina, aquela cabeleireira que trabalhou com o meu pai uns tempos. Agora tem salão dela. Essa sim, é que te vai meter um look à maneira."
E eu seguiria o conselho. E foi assim que comecei a seguir os trilhos de "ter estilo" e terminou a Era do "chapa 5".
Próximo capítulo, "As penas de ter uma cabeleireira lésbica, poupas, gel, e frio nos abanos."

O Carniceiro "Favinha" e a maldição de Spock

Feijó, 1982, mais coisa menos coisa. O "Favinha" era o barbeiro à moda antiga onde pai e filho cortavam o cabelo nessa época. Daqueles de azulejos brancos, calendário na parede, tecnologia do tempo em que o barbeiro inaugurou e barbeiros mais clientes que não são jovens desde esses tempos, igualmente. Cortar o cabelo, quando se tem 6 anos não nos vale as ralações estéticas que nos atormentarão anos mais tarde. Duas ou três vezes por ano, levamos uma carecada, que crescerá em forma de touca desgrenhada até que nos comece a tapar os olhos, que é quando levamos renovada carecada. É pacífico e é tranquilo. Miudos há que têm pânico de cortes de cabelo. O meu irmão, por exemplo, chorava baba e ranho e só sossegaria, vá-se lá saber porquê, se o deixassem enfrentar o corte de cabelo de pé. Mas eu não. Até me agradava aquele momento sossegado em que sentiria massajar o couro cabeludo e o arrepio da lâmina junto à nuca.
O favinha era um barbeiro de mãos destras e rotinadas ao corte chapa 5, o único que sabia na realidade fazer. E por isso a tesoura navegava veloz por entre o pelo, enquanto que os olhos do favinha provavelmente se amotinavam na rota da conversa cusca com os clientes habituais.
Naquele dia a coisa correu mal. Uma razia infeliz no recorde de patilha e o Favinha tesourava-me a orelha na parte superior da orelha esquerda. O míudo urra de dor e o sangue jorra e o favinha atrapalhadíssimo. a tentar estancar a ferida.
Nunca mais me esqueci desse dia. A ferida sararia. Mas deixaria a orelha sem sua curva natural, passando a terminar, até hoje, um desenhado bico ogival, como se fosse uma do Mr. Spock, referência cultural que me valeu alcunhas nos anos que se seguiram, ou de, numa comparação mais contemporânea, de um Hobbit de Tolkien.
Não ganhei fobia ao barbeiro. Mas durante alguns anos sustive a respiração de cada vez que a tesoura fizesse uma tangente às orelhas, à perfeita e à mutilada.
Próximo capítulo...
O Barbeiro Manel e a Era do "Chapa 5" da Barbearia do Largo do Tribunal

Verdades domésticas

A melhor metodologia de gestão doméstica é ter orçamento para empregada.

Acordes incompletos

Há já alguns anos escrevi esta canção. Hoje finalmente descobri os acordes certos para a tocar. E porém continuam a faltar duas coisas: um título e chegar a perceber a mulher que a inspirou...
O Sol cruzou a Lua,
num universo inesperado.
Cruzarem-se na névo ainquilinos do céu
que viviam lado a lado.
E ela mostrou-lhe a face oculta.
E ele confessou que era um eclipse.
E foi a sorrir que ela escutou
aquilo que a cantar ele lhe disse:
"Vem, ó Lua,sai do teu quarto minguante.
Vem ter a minha casa,quero ser o teu amante."
O Sol cruzou a Lua,
sem fazer caso das trevas.
"Bem vês, ó Lua, o nosso chão é um sonho,
o nosso céu são incertezas.
"Porque tu és só uma face oculta ~
e bem sabes que que eu sou um eclipse.
Mas falta-te saber aquilo que tu és,
a dona deste astro,
tudo o que eu não te disse!
Lua, leva-me à tua ilha, vamos ver as estrelas...
Assim por tantas noites,
em que não mais nasceu o dia,
sentado junto ao rio,com sede de luar,
um Sol-melancolia.
Mas ela não cruzou essa margem
e ficou só uma quimera.
E o Sol voltou para casa
e na margem desse rio
já ninguém está à espera.
Lua...... escuta...hoje se cala a paixão.
Vou guardar o teu rosto
nesta canção.

O Corpo é que paga

Cheguei agora do meu "cafézinho". São 1h da amnhã. Estou sem sono. Agi depressa demais para o meu gosto.Às tantas precipitei-me. Não sei o que fiz..... ......asneira? não? já fiz. Está feito.Resta esperar pelos "frutos".
Talvez quisesse ver se estava bem...se estava como antes. Sempre fui racional. Ponderava minunciosamente cada acto, cada gesto...cada "se". Mas, ultimamente perdi esse control. Fiz coisas que nem sei como as fiz. Pertence ao passado. Ainda não superei a 100%. Hoje fui às tantas longe demais. Dei para receber em troca a sensação de que estou bem... ...que continuo a mesma Joana e paradoxalmente não estava a mesma ao fazer as coisas levianamente.
É... ao fim ao cabo... desde uns tempos mudei sem me aperceber. Fui forçada a isso, está ai o resultado de um dia de perda de controlo....esse dia, que quero esquecer tornou-me mais impulsiva...mais instintiva... talvez menos romântica e doce.... mais forte por um lado....mais frágil por outro. Fraquejei para ter certezas de que sim continuo a mesma mulher.
Agora resta ver se essa certeza dura muito e que a façam crescer a cada dia.
Se estou feliz? cinicamente diria"claro que sim". Mas eu de cinica não tenho nada e diria: "espero ser feliz." Estou a dar os tijolos da felicidade, muito precipitada a construção...mas ...olha que se lixa. Mais vale 1 momento assim....do que a solidão.
Depois resta dizer:"O corpo é que paga sempre..." deixa ver quando começam a correr os juros.

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Verdades domésticas
Passar uma vulgar salsicha de lata na chapa antes de marchar para o pão, juntamente com um bocadito de caril, transforma o cachorro numa iguaria a fazer lembrar as que se comem nos restaurantes de cozinha supostamente israelita.
Corte de cabelo I - O prólogo
Desde que com a puberdade despertou em mim a vaidade, que o corte de cabelo regular se transformou num acto cheio de ansiedade. Um gajo anda uns dias a mirar-se no reflexo das montras, a indagar se é prudente alterar a imagem. E se fica mal? Depois, meia bola e força, sentamo-nos na cadeira da verdade e encomendamos à cabeleireira: "Olhe, corte assim e assado." - e ficamos a ver a evolução daquilo. "Epá, está a ficar óptimo! Epá, agora não, pôrra, não cortes tanto aí! Estragou tudo! Epá... ... estou mais bolachudo. Fogo, estas entradas! Ai que orelhas de abano tenho eu..." Umas vezes saimos de lá confiantes, a sentirmo-nos muita bons. Dá vontade de ir comprar um fato caro e um carro desportivo que condiga com o nosso very stylish hairdo. Outras a tesoura menos mestra da cabeleireira castra-nos o ego. E esgueiramo-nos dali cabisbaixos, na franca sensação de que todos nos olham na rua e se riem à socapa. A sensação perdura pelo menos uma semana. E se no entretanto não passar, há que consultar um médico... ... psiquiatra... ... até porque a verdade, é, francamente, ninguém notou sequer que cortámos o cabelo.
Eu tenho um namoro comprido com o mester de cabeleireiro. Episódios edílicos, turbulentos, negros, e, de certa vez, violentos.
E foi assim que à laia de introdução o Rui aqueceu a plateia para que o ouça narrar as suas aventuras e desventuras de cortar o cabelo...
Próximo capítulo... ... O Carniceiro "Favinha" e a maldição de Spock

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Hoje era o dia da "amiga" dizia-me a Açoriana. Que nos Açores comemora-se este dia almoçando-se ou jantando-se em grupo de amigas!
Oscilei muito. O café no duqs sim...esse estava prometido. Mas... ...change of plans. Agora falava-se em jantar e saida soft.
Mas hoje já tinha planos...só daria para o café do sexo e a cidade. Nada mais. Contudo a amizade está cá. Comemoro-a todos os dias. Pensando nas amigas, como é óbvio.
Hoje... ....foi um resto de final de tarde importante para mim. Acho que estou a escrever umas novas páginas na história que é a minha vida. Apago as mais tristes e severas.... substituindo-as por aventuras saudáveis.
Hoje "aventurei-me"... soube-me bem..... .....estou feliz. Estou a pensar que 2007 afinal reservou-me coisas boas. Surpresas. Recordar o passado... ....mas passado que no presente se apresentou novo. Renascido. Estou contente. Estou a descobrir uma nova alma. Melhor...claro.
O amanhã logo se verá. Se cair...ao menos caio a sorrir e levanto-me rápidamente. Mas posso dizer: decidi viver um pouco e apostar. Dar uma "chance".

A equipa contrária rejubilou quando correu a boa nova de que este Domingo vou jogar à bola.

Têm todos muita graça!

Mais uma verdade doméstica: há dias que sabe mesmo bem chegar a casa e não fazer absolutamente puto de nada!